Daniela Coelho aborda as questões ESG e a ansiedade da comunicação

[Artigo] ESG e a ansiedade da comunicação

Recentemente, ouvi um diretor bastante envolvido nas questões ESG (Ambiental, Social e Governança, em português) dizer que muitas empresas estão só querendo passar de ano, sem aprender a matéria. A afirmação resumia sobre a necessidade de as empresas quererem divulgar rapidamente seus relatos de sustentabilidade, sem ao menos terem feito a lição de casa, o que significa seguir alguns passos, como mapear o que é material, engajar stakeholder, definir metas e estabelecer as ações, entre outras etapas importantes.

 

É muito animador ver toda a movimentação que o tema ESG está gerando, principalmente aos olhos de quem está envolvida com o tema e se preocupa com questões ambientais, inclusive mudando o estilo de vida e de consumo, como é o meu caso. Sair do âmbito pessoal e poder trabalhar com isso gera uma satisfação enorme. Mas, daí, vem a realidade e mostra que nem todo mundo está buscando a sustentabilidade de maneira genuína. Então, quando recebo uma demanda dizendo “quero ser uma empresa ESG, quanto custa?”, toda a minha satisfação fica um pouco abalada.

 

Para não achar que somente o meu ponto de vista é o que faz sentido, faço um exercício para poder entender quem quer pegar o fast-pass e não gastar tempo na fila. Afinal, é importante saber o que as empresas pensam, quais são suas dores, os seus objetivos e quem está patrocinando o assunto. Coletando as principais motivações das inúmeras empresas com as quais tive contato nos últimos meses, entre elas aquelas que querem comunicar os seus relatórios, é possível constatar alguns pontos em comum.

 

Muitas entendem que já possuem as iniciativas que as tornariam “elegíveis” ao título de sustentável. Com isso, bastaria colocar no papel e gerar o relatório. Afinal, “já possuímos ações de responsabilidade social, como doações à comunidade do município, onde temos uma planta industrial”. Iniciativas como esta são excelentes e trazem um impacto positivo. Porém, será que são suficientes? O que mais é relevante ao negócio? Como sua estratégia conversa com o que é material para o seu setor? E, além da comunidade, tem algo em sua cadeia de valor e na distribuição dos seus produtos que gerem impactos ao meio ambiente, por exemplo? Como está sua governança?

 

Outro aspecto observado é a necessidade de mostrar a alguns stakeholders, como investidores, acionistas, ou mercado em geral, que a empresa já está com ações ESG em andamento, possivelmente para captar recursos, ou mirando um futuro IPO, por exemplo.

 

Os investidores já estão bem atentos em relação a um possível “ESG-washing”, ou seja, quando uma empresa aplica um posicionamento, mas não o faz. Então, relatórios bem diagramados, com fotos espetaculares, não vão necessariamente dizer o que os investidores querem ouvir.

 

Temos, também, as empresas que precisam se adaptar por exigência de seus clientes. Para alinhar seus objetivos ao longo da cadeia de fornecimento, muitos clientes estão requisitando que seus fornecedores tenham práticas sustentáveis. Vale lembrar que ter um relatório não implica em ter práticas de impacto positivo. Se o cliente tem instrumentos efetivos para monitorar e auditar seus fornecedores, não será o relatório por si só que garantirá à empresa estar adequada às exigências de seus clientes.

 

O processo para a elaboração do relatório de sustentabilidade tem que ser visto como um instrumento de gestão, que pode influenciar a tomada de decisão. Lembrando que para o relato ser equilibrado, não se pode divulgar somente as contribuições positivas, ignorando impactos negativos relevantes. Outro ponto é ficar atento ao que chamamos de cherry-picking, termo que, resumidamente, significa selecionar as metas que são mais fáceis, em detrimento do que realmente é impactante. Assim, podemos dizer que o relatório é a consequência de um trabalho que não se resolve em poucas semanas.

 

Mesmo diante do cenário descrito, é importante reconhecer todo o esforço e engajamento que tem ocorrido nas empresas. É animador saber que este momento chegou, finalmente. E isso é muito legítimo. Cabe a todos, diretores, conselho, acionistas e consultores, acharmos o tom para que essa causa seja tratada de forma séria e que traga mudanças concretas. Afinal, todos (ou pelo menos a maioria) querem tornar o mundo um lugar melhor.

 

*Daniela Coelho é diretora associada de riscos e performance na ICTS Protiviti, empresa especializada em soluções para gestão de riscos, compliance, ESG, auditoria interna, investigação e proteção e privacidade de dados.

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